Janaina Ravagnani, SRC
Vivemos atualmente em um mundo individualista. Mundo este em que a cultura e as artes, incluindo a boa música, estão tentando sobreviver, com muito esforço, mesmo que seja para ou através de um pequeno grupo.
Este pequeno grupo é como se fosse um barquinho remanescente de um naufrágio e que tenta sobreviver no meio do mar que é o lixo comercial que recebemos diariamente da mídia. Mídia voltada quase que exclusivamente para o que é nulo, num círculo vicioso de geração de lucros a despeito da qualidade, da cultura e dos debates sociais, trabalhando com base numa pseudocultura que nos é imposta dita globalização, que, na forma como nos é apresentada hoje, favorece os mais ricos e massacra os mais pobres.
Vivemos num mundo caindo aos pedaços, onde questões básicas como a fome ainda não foram solucionadas, onde crianças assaltam e matam por um par de tênis ou um pedaço de pão, onde pessoas morrem nas portas de hospitais por falta de atendimento, idosos padecem em filas intermináveis, enquanto que a população está sendo anestesiada numa espécie de hipnose apática com estupidez do tipo de um programa de tevê que confina um grupo de pessoas numa casa, onde vale tudo, ou de letras insensatas e vazias, promovendo a anticultura. Parece que quanto maior é a idiotice e a falta de conteúdo, maior é o sucesso.
E este lixo comercial que alguns chamam de música chega aos adolescentes e às crianças através de todas as formas de mídia possível, como a televisão, a internet, e sobretudo, no caso específico da música, através das rádios, que são compradas pelas grandes gravadoras, na sua maioria multinacionais, para que toquem somente aquilo que vende, que dá lucro. Qualidade, preservação da cultura nacional e conhecimento ficam sempre em último plano.
Visto isso, podemos dizer que hoje em dia a boa música está ameaçada de extinção. Quando digo boa música, me refiro à música no sentido mais amplo da palavra, o que inclui desde a música erudita, fundamental na formação de um indivíduo, a música popular brasileira, formadora e difusora da cultura do nosso país, músicas folclóricas e de raízes em geral, bem como outros tipos de música e manifestações musicais que representam a cultura e o saber e muitas vezes até justificam a existência de um povo.
E nós o que podemos fazer? Na maioria das vezes nos sentimos impotentes e de mãos atadas diante de uma situação que parece ser definitiva. Como podemos lutar contra todo um sistema imposto, navegando contra a maré?
Podemos, devemos e temos essa obrigação, se não para conosco, para com os nossos filhos e as gerações vindouras.
Para que a cultura, as artes e a verdadeira música sobrevivam nesse mundo cada vez mais individualista, é preciso reavivar os debates, seja na escola, seja nas rodas de discussão, nas instituições públicas ou nos meios de comunicação de massa. E uma boa maneira de começarmos é em casa, formando e educando filhos conscientes, para que se tornem indivíduos questionadores e providos de consciência e espírito críticos.
Nada mais eficiente na formação de indivíduos conscientes do que a culturalização destes indivíduos, ou seja, uma formação cultural, artística e, porque não, filosófica sólida, as quais, se não chegam às crianças e adolescentes através das escolas e da mídia, podem e devem chegar através dos pais e da família.
É através de uma aula de música, estudando a época e o estilo de compositores clássicos por exemplo, ou fazendo um curso de teatro, ou ainda através das artes plásticas ou visuais, ou de qualquer outra manifestação genuinamente artística, que somos capazes de adquirir uma percepção mais sensível, livre de pré-conceitos e global do mundo que nos cerca.
Incentivando o aprendizado de um instrumento musical, estamos tornando nossos filhos mais cultos, mais sensíveis, mais predispostos a entenderem e a questionarem o mundo em que vivem.
O estudo da música envolve sensibilidade, espiritualidade, perseverança, dedicação, valores estes importantes na formação de um indivíduo, e que vêm sendo esquecidos e postos muitas vezes de lado.
Pesquisas da psicologia já provaram que o estudo e o conhecimento um pouco mais aprofundado da música, sobretudo da música erudita, facilita a convivência entre as pessoas e proporciona mais harmonia dentro das famílias.
Música envolve o estudo da história, de épocas diferentes, de estilos, de culturas. Ela incita e desperta curiosidade, abre novas fronteiras, marca épocas, divide opiniões, provoca debates críticos, revela talentos, forma compositores, cria estilos, inova. Música envolve paixão, amor, entrega, sentimentos vitais para as pessoas e para a própria continuidade da existência humana.
Ressaltamos então, a importância da consciência dos pais com relação à formação musical e cultural das crianças e adolescentes de um modo geral, para que esses e outros debates se reacendam e para que possamos ajudar na formação de uma sociedade melhor.