Manuel O. S. Pina – FRC
Há cerca de dois mil anos atrás houve um estranho acontecimento astronômico: uns dizem que eram os planetas todos alinhados num cortejo brilhante em relação ao sol; outros contam que havia uma estrela refulgente movimentando-se do oriente e indicando um caminho. Não se sabe bem como foi, sabe-se apenas que naqueles dias nascia uma criança destinada a revolucionar o mundo.
Uns senhores que eram magos e a quem chamavam reis sabiam o que estava para acontecer, como o sabem sempre os homens sábios deste mundo. Deitaram-se ao caminho e procuraram essa criança para a adorar e lhe fazer ofertas – dizem que de ouro, incenso e mirra.
Houve um quarto mago, que não era rei, que ouviu falar dessa criança e foi também procurá-la. Mas não a encontrou. Procurou por todos os caminhos, todas as estradas e não a conseguiu encontrar. Mais tarde ouviu também falar de um homem a quem chamavam de Nazareno, mas não foi escutar as “Bem Aventuranças” nem esteve no Calvário.
Não tendo encontrado a criança nem ouvido o Homem do Sermão da Montanha, nem por isso deixou de usar Seu nome durante os séculos da história do Mundo que ajudou a construir. Pelejou em todas as batalhas. Bateu-se em todas as guerras “santas”; conheceu vitórias e derrotas, teve oportunidade de perdoar os seus inimigos e ser perdoado por estes, mas nenhum deles sabia o que era o perdão. Embarcou em todas as naus que cruzaram o planeta levando nas velas impresso em vermelho sangue o símbolo daquela Criança e daquele Homem que não conseguira encontrar, e nem lhe viu sequer o rosto nas mil faces estranhas que encontrou em todos os fins de mundo.
Construiu fortalezas e cidades, inventou tudo quanto havia a inventar, perscrutou as estrelas e estabeleceu teorias, prescreveu dogmas, doutrinas e receitas de felicidade. No entanto, continuava muito longe de vislumbrar o rosto daquela criança.
Contudo, a semente um dia deitada à terra crescia, expandia-se em mil ramos, no meio de agonias e desespero, entre as muitas fomes e os muitos sofrimentos. Resistia às calúnias e à intolerância, escondia-se no coração de alguns aonde humildemente ia florescendo, no lugar mais íntimo daqueles que, não sendo magos sentiam dentro de si aquela pequena luz, aquela centelha a pulsar.
Entretanto… alguém chorava e orava. Pedia pelos desprotegidos, pelos injustiçados, pelos famintos, pelos perseguidos, e também pedia pelo quarto mago que tinha todo o poder da riqueza, pedia piedade para com o seu coração endurecido e para que ele um dia pudesse despertar.
Os tempos chegaram em que o quarto mago que não era rei, depois de tudo saber e tudo poder, começou a sentir que afinal… pouco ou nada sabia e que o poder de pouco lhe valia para a sua alma esquecida em tantas andanças em busca de nada. À sua volta acumulavam-se os destroços do seu egoísmo. Tudo lhe parecia estéril, até o arco-íris lhe parecia cinzento.
A dúvida instalou-se no seu coração e sentiu nascer em si todas as angústias. Foi em busca de outros magos, que também não eram reis, que procuravam curar-lhe as mazelas do corpo, que da alma nada sabiam. Percorreu todas as igrejas, fez oferendas, tentou comprar a paz que lhe faltava a outros magos da ciência que do espírito nada entendiam. Lembrou-se então daquela criança e vestiu-a de vermelho, deu-lhe um ar de patriarca e chamou-a de Pai Natal. Fê-la entrar pelas chaminés ou percorrer os céus num trenó puxado por renas. Não sabendo adorar, substituiu o presépio pela árvore de luzes cintilantes das mil prendas com que se contentam todos os magos que não são reis.
Pode ser, que um dia destes, os planetas se alinhem de novo no capricórnio crístico ou que uma estrela venha dançar por sobre a Terra, indicando que a Esperança e o Amor podem ser renovados.
Pode ser, que desta vez, o mago que nunca foi rei, encontre o caminho que o seu coração rejubile e que suas mãos se abram em oferta de ouro, incenso e mirra para Aquele que veio para se instalar em nosso coração, para todo o sempre.