Quando a firmeza definhar, apela para tua razão; quando a resignação te abandonar, recorre à esperança. (A Vós Confio)
O autor da antiga citação supra tinha profundo conhecimento da natureza humana. Provavelmente, um dos valores de todos os escritos contidos na obra A Vos Confio decorre da compreensão por parte do autor, da natureza do homem e de si mesmo. Este fato também é verdadeiro quanto a outra espécie de literatura que é eterna e tem perdurado através das épocas, a despeito da mutação nas condições e situação do homem. As ideias, conceitos, estórias ou observações que não resistiram à prova do tempo, isto devem ao fato de que não conseguiram satisfazer ao teste da capacidade do homem. Tudo que perdura é aquilo que o homem pode perceber, apreciar e compreender.
Durante o espaço de tempo em que evoluiu para atingir o estágio em que hoje se encontra, o homem tem tido sucessos e fracassos. Tem sentido a inspiração e a depressão. Tem experimentado a felicidade e a dor. Tudo isto faz parte da natureza do homem, e essas experiências perdurarão enquanto o homem existir.
Na citação no começo destes comentários, estes fundamentos são devidamente levados em consideração. Primeiramente, afirma o autor que a falta de firmeza deve provocar o apelo do homem à sua razão. A palavra firmeza não é comum em nosso vocabulário atual. Possivelmente, requer definição. Basicamente, significa estabilidade e fidelidade. Ela encerra a ideia de se ter um propósito ou ser constante na mente e nas atitudes. O indivíduo que expressa firmeza é aquele que tem visão e um ponto de vista mental definido, invariável e firme, que não está sujeito às vicissitudes que afetam a vida cotidiana. Em outras palavras, homem firme é aquele que se tornou capaz de adotar uma filosofia de vida que o satisfaz, a despeito das mutações nas circunstâncias e meio-ambiente que o afetam.
Uma coisa é certa: o nosso meio ambiente e as condições que nos cercam não serão sempre os mesmos. Nenhuma pessoa pode esperar viver toda uma existência com o mesmo meio ambiente e as mesmas condições ao seu redor. Podemos desejar que as condições em que vivemos não sejam modificadas por fatores externos além de nosso controle, ou mesmo por nossos próprios erros, porém o fato é que elas serão modificadas. Portanto, podemos tirar proveito da sabedoria dos antigos que afirmavam que quando a nossa firmeza definha temos a possibilidade de apelar para a razão com o objetivo de restaurá-la.
A razão, todavia, nem sempre se constitui em certeza muito satisfatória, ou melhor, é fácil raciocinarmos sobre aquilo que seria melhor ou que deveríamos fazer. Podemos cometer erros de raciocínio, porém, de modo geral, não são esses erros que nos preparam ciladas, mas o fato de que a nossa decisão pode ser baseada mais em uma reação emocional do que na sólida razão. Quando criamos uma filosofia de vida que nos permite firmeza até certo ponto, então a razão pode vir em nosso auxílio. Analisando constantemente as condições que interferem com as nossas esperanças e desejos, podemos nos tornar capazes de restabelecer a firmeza, ou melhor, a imutabilidade de propósito e a inflexibilidade de determinação que nos ajudarão a concretizar as esperanças e os desejos da vida, que muito para nós significam.
Provavelmente, a mencionada citação antiga, ou o seu autor, compreendeu que a razão algumas vezes nos abandona devido à nossa própria impaciência. É possível que um plano que tenhamos feito tenha fracassado ou que não nos tenha proporcionado aquilo que esperávamos; assim, recorremos à razão para tentar remediar a situação, juntar o que sobrou, reexaminar a nossa posição e fazer novos planos. Em assim fazendo, todavia, verificamos que, de certo modo, estamos às voltas com um quebra-cabeça de tremendas proporções.
Compreendemos o valor da razão, e que possivelmente conseguiremos reunir todas as peças desse quebra-cabeça, porém, ficamos impacientes e, em nossa impaciência, tornamos a situação pior ou mais confusa. Portanto, baseados nessa antiga injunção de que se não pudermos manter a resignação deveremos, então, recorrer à esperança, verificamos que esta é o meio pelo qual podemos olhar além das circunstâncias do momento presente.
Quando tudo é negativo, quando as condições parecem estar além de nosso controle, quando o fracasso parece iminente, quando todos os elementos do conhecimento, da experiência e da razão que podemos concitar em nosso auxílio parecem nada provocar senão desânimo, tristeza, e fracasso, então a esperança poderá lançar luz em nosso caminho e nos reorientar. A despeito de quão adversa determinada situação nos possa parecer, ou da maneira em que possamos estimar as circunstâncias que nos cercam, verificando que nada parece indicar melhor solução, a esperança pode sempre instilar em nós certo grau de otimismo.
O homem, todavia, não pode viver apenas de esperança. Não pode visualizar um futuro sem alguma base sólida, mas, na profundeza da depressão, quando tiver perdido a firmeza e quando a resignação o tiver abandonado, a esperança será o único elemento capaz de criar um ponto de vista mais animador. Recorrendo à esperança, poderemos, pelo menos, criar otimismo para eliminar o pessimismo, abrir caminho para realizar algo quando todas as portas parecem estar fechadas, expressar ânimo quando todos os demais fatores parecem se unir para provocar o desânimo. A esperança é o elemento de que dispõe o homem para, temporariamente, enfrentar o desalento e a depressão do presente, porque a esperança sempre pode se converter em ponto de vista novo e mais encorajador. Ela pode representar o começo de um novo amanhã.